22 de janeiro de 2013

a minha cob(v)ardia

descobri agora mesmo que a palavra cobarde tanto se pode escrever com v como b. somos tão indecisos nós, os portugueses. nunca temos bem a certeza se estamos preparados para fazer uma declaração séria. talvez porque mesmo a nossa lingua seja tão pouco para brincadeiras.
o português dá sentido ao melancólico e nostálgico mas retira, na maior parte das vezes, a piada às coisas mais simples. em português os trocadilhos linguísticos são tão dificeis que, mesmo que os consigamos fazer é dificil encontrar quem os perceba e se ria.

mas deixa-me voltar ao que te queria dizer. eu, minha querida, sou realmente uma cobarde (prefiro escrever com b, soa-me melhor). colocar-me lá fora, pronta para o risco e fugir quando ele chega tem muito mais de cobardia do que nunca sequer por lá fora os pés. não indo lá fora não magoria ninguém. indo, fodo-lhes o coração vezes e vezes sem conta. o que faz de mim, concluíndo a equação, uma cobarde má.
a verdade é que a minha vontade é tanta e a minha ânsiedade tão imensa que me sufoco nas emoções que o sentir acorda, que me deixo afogar no mar do meu amor sem que o outro me toque, sem que eu lhe toque a ele, sem que nenhum de nós se toque. sem que nenhum toque me impeça o fugir.
entorpeça-me a vista, o amor. o meu amor, porque o dos outros vou ignorando, e desistindo, e deixando-os passar sem que me toquem. melhor do que Moisés eu afasto as águas do meu caminho para que o risco se mantenha afastado, bem dentro das esferas a que pertence.
quem me dera a mim um dia, ao menos ter a coragem de assumir que não tenho coragem e deixar-me fechada em casa sem colocar um único pé lá fora.

talvez assim o rasto de sangue que me persegue fosse menor, talvez assim nenhuma culpa me assombrasse no banho ou nos sonhos, talvez assim a ninguém me ferisse olhar nos olhos, talvez assim deixasse de amar tanto este amar desencontrada dos outros.

se não fosses tu e o meu outro amor, eu jurava-te agora mesmo que o meu medo é tanto que nunca saberei a ciência da simbiótica do amor. mas sei-o bem, e quase decor, e por o saber tão bem o nego aos outros. não sei se possuo no corpo partes suficientes para sofrer com mais um amor. não sei se possuo no corpo capacidade suficiente para suportar a iminente incerteza de mais uma perda. se te perdesse a ti, perdia parte de mim, se o perdesse a ele, outra parte iria. se perder um outro o que me restará se não a cabeça?
e só com a cabeça o que me restará que soe melhor do que a própria morte?

1 comentário:

  1. a nossa casa é demasiado fria para ficares cá dentro eternamente, meu amor. já dizia um grande sábio da escrita que agora as pessoas se apaixonam por conveniência, porque está ali ao lado, porque fica bem, porque temos cama lavada, lembraste quando eu fazia isso? isso é um insulto a quem luta, a quem se esperneia para conseguir uma história mais bonita do que aquelas que nos impingem em pequenos.
    já não somos pequenos e já sabemos que não existe um príncipe que nos espera num cavalo branco, não temos sequer um cabelo comprido que deixa um brilho por cada terra por que passa. já não somos pequenos e sabemos que lá fora, fora desta casa fria, deste lar que construímos, está um cabrão à nossa espera, pronto para nos foder o coração.
    quem somos nós senão aquelas a quem mordem o coração? quem és tu senão aquela que deixa marcas no corpo de cada ser humano pelo qual passa?
    quem és tu senão aquela que contribui para que esses cabrões tenham histórias de amor para mais tarde contarem àqueles que deram vida?
    não fiques em casa porque esse não é o teu lugar. o mundo precisa daqueles que ainda acreditam num grande amor, senão estamos perdidos.
    e na minha cama só há lugar para um.

    ResponderEliminar

amanhã talvez não